Crítica | Fahrenheit 451

Apologia da palavra através de imagens


Fahrenheit 451
Direção de François Truffaut
1966 : Inglaterra : 112 min
Com Oskar Werner  (Montag) e
Julie Christie (Clarisse e Linfa)

Embora seja um filme que enaltece a palavra escrita, os créditos de Fahrenheit 451 são dados em áudio. Essa forma atípica de começar um filme anuncia o enredo, que trata de uma sociedade futurista em que a palavra escrita é condenada e os livros são proibidos porque trazem infelicidade às pessoas. O filme é baseado em romance homônimo de Ray Bradburry, escritor americano de ficção com grande sensibilidade para questões humanas.

Onde há livros há problemas

Montag é um bombeiro devotado ao trabalho e prestes a ser promovido. Os bombeiros na sociedade do filme não apagam incêndios, até porque as casas são à prova de fogo. A função deles é procurar e queimar livros, que entram em combustão aos 451 ºF (ou 233 ºC). Os livros são considerados uma ameaça à sociedade e Montag os queima confiante que isso é uma ação natural praticada desde tempos imemoriais.

Mas um dia ele conversa com sua jovem vizinha, que coloca algumas sementes de subversão em sua cabeça de bom moço. Ela pergunta a Montag se ele já leu algum dos livros que queima. Depois disso, Montag começa a questionar o seu mundo perfeito, sua esposa perfeita, seu trabalho perfeito e todo esse questionamento o levará literalmente ao fim da linha.

Tecnologia da opressão

Algumas pessoas adoram odiar a tecnologia. A distopia de Fahrenheit 451 se passa em um mundo em que a tecnologia é onipresente.  As pessoas vão ao trabalho em trens suspensos. As casas são à prova de fogo, as portas abrem e fecham automaticamente, há uma enorme televisão widescreen na sala e telefones em todos os cômodos.

Nada que impressione o espectador da atualidade. Talvez nossa vida hoje seja mais marcada pela tecnologia do que a mostrada no filme. Mas o que se entende, ao assistir Fahrenheit 451 é que a tecnologia é um dos pilares do sistema de controle da sociedade totalitária ali retratada. A desconfiança em relação à tecnologia, embora paranoica em alguns casos, tem sua razão de ser.

Os europeus, em especial, viveram experiências amargas em que a tecnologia esteve a serviço de máquinas de guerra totalitárias. O segundo pilar da sociedade do filme é a massificação. As pessoas moram em pombais, fazem as mesmas coisas, têm as mesmas perspectivas e há um grande medo de ser diferente dos outros. Todos escondem seus sentimentos para criar uma fachada de bem estar e acham natural usar drogas medicinais para resolver seus os seus problemas psicológicos.

Distopia do conformismo

Os homens são funcionários exemplares e as mulheres, donas de casa dedicadas. O conformismo é a virtude mais apreciada nessa sociedade de puxa-sacos, delatores e papagaios repetidores de frases prontas. A repressão ao pensamento crítico é o terceiro fundamento da sociedade retratada no filme e a queima dos livros é o ritual pelo qual essa repressão se manifesta.

Algumas pessoas podem achar Fahrenheit 451 um filme de intelectuais para intelectuais. Sim, há um elogio aos intelectuais no filme. Eles são os homens-livro e o filme é uma declaração de amor aos grandes livros que a humanidade produziu. Há uma crença no poder dos livros e na resistência guerrilheira dos intelectuais para salvar o mundo, o que pode soar ingênuo, mas ingenuidade mesmo seria duvidar da importância da alta cultura para a sociedade.

Fahrenheit 451 não tem aquele ambiente pesado de outras distopias futuristas do cinema como 1984 ou Matrix. Por retratar uma sociedade fria e robotizada, também não há uma grande tensão emocional no ar. É um filme que leva à reflexão e isso ele faz muito bem. A sociedade mostrada no filme estará muito distante da realidade? Provavelmente, o mundo real é mais cruel em muitos pontos do que a ficção de Fahrenheit 451.

Sim, no mundo real a cultura é maltratada e se queima livros das mais variadas formas e isso não é uma característica exclusiva de ditaduras totalitárias. Altas taxas de analfabetismo equivalem a queimar livros. Deixar a cultura sem incentivos é como queimar livros. Felizmente, sempre existiram os homens-livro que lutam contra toda sorte de dificuldades para preservar a palavra.

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