Crítica | Tropa de elite

Faca na caveira, nada na carteira

Direção de José Padilha
2007 : Brasil : 89 min
Com Wagner Moura (Capitão Nascimento),
André Ramiro (Aspirante André),
Caio Junqueira (Aspirante Neto),
Milhem Cortaz (Capitão Fábio),
Fábio Lago (Baiano) e
Fernanda Machado (Maria) .

Não tem lado bom nessa história em que o bandido é bandido, a polícia militar tem corrupção no DNA, os favelados colaboram com o crime, a classe média financia o tráfico e a tropa de elite faz justiça a bala. Nessa terra de ninguém, cada um desempenha o papel que lhe cabe criando o equilíbrio dinâmico da violência.

Pela perspectiva da polícia

Capitão Nascimento lidera um grupo do BOPE (Batalhão de Operações Policiais Especiais) na cidade do Rio de Janeiro. Com seus homens, ele realiza missões de alto risco com enfrentamento direto a traficantes em condições típicas de guerrilha urbana. Nascimento está na função há dez anos e quer deixar o cargo porque vai ser pai e não agüenta mais a pressão do trabalho. Para isso, precisa encontrar um substituto à altura. O filme conta a história da formação desse novo guerreiro.

Visão fascista? Bandido bom é bandido morto? Tortura faz parte da guerra? Seria ingênuo pensar que a visão do narrador e personagem principal é a visão do diretor. O capitão Nascimento se considera acima da lei e, para ele, a justiça instantânea que pratica é natural como beber água. No entanto, o filme não traz uma aprovação implícita dessa justiça feita pelos intocáveis do BOPE.

Sim, Tropa de Elite conta a história de soldados que lembram Rambo, tem tiro e palavrão para todo lado, mas é um filme complexo que deixa um resíduo de reflexão no espectador depois que cessa o tiroteio. Não adianta implicar com o filme porque ele mostra algumas pessoas de um jeito que você não gostaria que mostrasse. Há indícios razoáveis para crer que o retrato tem fundo de verdade e a verdade dói.

Conflito de classes sociais

Tropa de Elite não se aprofunda no perfil dos bandidos. É um filme em que marginais são aquelas coisas que caem quando levam tiros. E se levaram tiro é porque mereciam. A polícia militar, especialmente seus oficiais, é vista como uma corja de corruptos bufões. O capitão e cafetão Fábio faz a gente rir com suas trapalhadas e rolos intermináveis. A juventude de classe média alta é retratada como ingênua e hedonista; inocentes úteis que papagaiam um discurso intelectualizado sobre a pobreza e a violência.

 É cômico vê-los discutindo filosofia da Justiça enquanto puxam um baseado. Os moradores da favela aparecem como pessoas manipuladas por traficantes e pelo poder público. Certamente, nenhum dos grupos retratado pode ser reduzido ao recorte limitado de um filme de duas horas. Mas vamos ser sinceros: o filme chega perto com seu jeitão sumário de retratar as classes sociais.

O cinema já produziu muitos filmes que retratam soldados de elite, mas geralmente são visões glamourisadas do guerreiro. Tropa de Elite mostra soldados de elite em um contexto pouco cavalheiresco. Eles são durões, corajosos, altamente treinados e habilidosos, correm risco de vida diariamente, suas convicções são sólidas, sua dedicação é inquestionável. Essas virtudes raras acabam gerando efeitos colaterais. Soldados de elite são arrogantes, ignoram e desprezam a visão do cidadão médio, se consideram especiais e investidos de uma missão sagrada e têm dificuldades para dosar os meios proporcionalmente aos fins. Aos poucos são tragados pela violência em que vivem em um processo de gradativa desumanização.

Obsessão pela morte

Com toda a sua densidade, Tropa de Elite é capaz de arrancar elogios entusiasmados dos fãs de Chuck Norris. Um caso raro de filme cheio de adrenalina e crítica. A edição de som primorosa nos coloca no meio do tiroteio. A câmera nervosa, que em alguns momentos fica salpicada de sangue, nos transforma em testemunhas oculares da guerra urbana. O enredo flui consistente e a tensão só aumenta.

Ao longo da ação, a morte vai colhendo vítimas em todos os grupos: favelados, policiais, bandidos, classe média e, por fim, na tropa de elite. A morte é uma obsessão para o BOPE. Não por acaso, o símbolo do grupo é uma caveira transpassada por uma faca.

O filme termina com um rito de passagem. O guerreiro experiente entrega a arma ao aspirante para o batismo de sangue. Durante todo o filme tentei descobrir o que o diretor pensava sobre a tropa de elite. Por que razão ele cortou as cenas de execuções praticadas pelo BOPE no instante do disparo? Posso estar enganado, mas é significativo o filme terminar com uma escopeta apontada para a cara do espectador.

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