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Fuga da Matrix | Resistência ao poder das Big Techs

Você já teve a sensação de que existe algo de errado no mundo perfeito da alta tecnologia? Já sentiu-se espionado por olhos invisíveis? Desconfiou que alguém influencia as suas decisões cotidianas? Sentiu-se preso à luz azulada das telas dos dispositivos digitais? Caso sua resposta às perguntas seja sim, apresento-lhe duas opções: abandonar esta postagem imediatamente (pílula azul) ou continuar lendo até o fim (pílula vermelha).

A escalada do abuso das Big Techs

Em poucos anos as empresas líderes em tecnologia digital deixaram de ser startups de garagem e subiram ao topo da lista de maiores empresas mundiais. Seus fundadores encabeçam a lista de homens mais ricos do mundo. Falo de Amazon, Apple, Facebook, Google, etc. Essas big techs lideram oligopólios em suas áreas de atuação e, em alguns casos, praticamente monopolizam o mercado.

Elas concentraram em pouco tempo poder comparável ao de políticos de influência mundial. Não é à toa que as big techs são tratadas como o quinto poder da sociedade depois de executivo, legislativo, judiciário e da grande mídia.

Liberdade, privacidade e segurança

Os usuários estão valorizando cada vez as três palavras acima. Nenhuma dessas necessidades é absoluta, mas algumas redes tem fracassado miseravelmente em prover liberdade, privacidade e segurança aos usuários.

Liberdade. Sejamos claros: ninguém está pedindo liberdade para os terroristas do Estado Islâmico postarem vídeos de execuções, nem para traficantes anunciarem drogas no Facebook. Extremos como terrorismo e ilícitos estão na zona proibida e pronto. O problema é quando a plataforma resolve intervir na área cinzenta das opiniões polêmicas. Aí aparecem os problemas de liberdade.

Privacidade. Se você quer um serviço gratuito tem que conviver com publicidade. Para evitar propagandas a opção é pagar pelo serviço através de assinaturas. Algum monitoramento da sua atividade para segmentar melhor as propagandas, para mim, é aceitável. Mas tudo tem limite. As big techs não podem se tornar big brothers.

Segurança. Ao usar um serviço de Internet você quer ter a tranquilidade de que seus dados não serão acessados indevidamente, repassados a terceiros suspeitos ou mesmo roubados. Infelizmente, tudo isso acontece com frequência no universo das big techs.

O caso Parler

Grandes poderes trazem grandes … abusos e as big techs estão passando dos limites com audácia crescente. Um marco nessa escalada do abuso de poder foi a censura ao então presidente Donald Trump em seus últimos dias de mandato. O presidente foi banido, suspenso, calado pelas Big Techs e a rede social Parler usada por ele foi derrubada em uma ação coordenada de Amazon, Apple e Google.

Num belo dia no início de 2021 eu abri a interface do aplicativo Parler e recebi mensagem de erro. O site da rede indicava domínio fora do ar. Pela mídia fiquei sabendo que tinham derrubado toda a plataforma.

Apple e Google retiraram o aplicativo de suas lojas e Amazon removeu o serviço de seus servidores. Eu não acompanhava o presidente americano, muito menos grupos de extrema direita. Eu usava o Parler para seguir jornalistas brasileiros respeitados.

Naquele dia entendi com clareza que estava nas mãos de meia dúzia de bilionários excêntricos. Eu já desconfiava das big techs e o caso Parler para mim foi a gota d’água. Por isso, compartilho as iniciativas que tenho adotado para um enfrentamento de guerrilha ao obscuro poder das big techs.

Minimalismo digital

Menos é mais. Reduzir a presença digital ao mínimo é a meta. Não chego ao extremo de abandonar as redes sociais e os grandes serviços digitais. Acessá-los é inevitável na vida moderna. São serviços entranhados em nosso cotidiano, mas é possível diminuir seu uso ao essencial. Algumas ideias para ir na direção do minimalismo digital:

  • Menos aplicativos. Faça uma limpa nos aplicativos do seu celular. Fique só com os estritamente necessários.
  • Menos grupos. Saia de grupos que só roubam seu tempo. Silencie, evite, exclua.
  • Menos notificações. Desative todas as notificações não vitais. Seja ativo. Vá ao aplicativo apenas quando for do seu interesse.
  • Menos redes. Reduza as redes sociais que você acessa. Foque no que você precisa.
  • Menos tempo de uso. Estabeleça um tempo diário máximo de uso de redes sociais e reduza gradativamente.
  • Menos e-mails. Crie regras no seu e-mail e descarte o que não interessa. Direcione para pastas secundárias as mensagens não urgentes. Cancele inscrições que não agregam.
  • Tenha objetivos. Qual a razão para você acessar uma rede social? Se você não tem uma boa resposta, não precisa dela.

Postura ativa

As big techs exploram ao máximo nossa passividade. Elas sabem que adoramos comodidade. Basta entrar no serviço e os conteúdos são servidos gentilmente por algoritmos atenciosos que decidem continuamente o que vamos ver.

Você pode abandonar aquela passividade de coach potato e fazer uso ativo dos serviços digitais. Assim, você escolhe e não é escolhido. Considere comportamentos ativos como:

  • Busca ativa. Faça busca por conteúdos e pessoas em vez de aceitar sugestões.
  • Sem propagandas. Pague por serviços livres de propaganda. Remunere diretamente o produtor de conteúdo e elimine a big tech que atravessa a relação.
  • Diversifique suas fontes. Nada de ir sempre no mesmo site, no mesmo influenciador, no mesmo buscador.
  • Login social não. Deixe de fazer login em outros serviços usando Facebook, Google e Twitter. Prefira o login normal do site.

Pílula azul x pílula vermelha

Esta parte se destina em especial a todos que priorizam privacidade e liberdade de expressão em vez de comodidade. As big techs têm preferências políticas, são seletivas com liberdade de expressão, fazem vista grossa para muita coisa ruim e são arrogantes na hora de cancelar usuários.

Diante dos riscos para sua liberdade de expressão procure redes e serviços compromissados com valores como respeito à privacidade e à liberdade de pensamento. Prefira serviços pílula vermelha. Nessas empresas você corre menos risco de ter sua privacidade vazada. Também são menores as chances de você ter acesso negado a conteúdo que lhe interessa.

Para quem gera conteúdo a diversificação tornou-se vital. Diversifique para correr menos risco de ser cancelado sem chance de apelação. Alguns exemplos de serviços pílula azul (comodidade e controle) e red pill (liberdade e desafios):

  • Blue pill: Facebook, Google, Instagram, Twitter, Whatsapp, YouTube.
  • Red pill: Duck Duck Go, Gab, Mastodon, Parler, Rumble, Signal, Telegram.

Talvez não seja possível substituir as redes azuis por redes vermelhas num tapa. Dependemos das redes azuis para muitas coisas, mas uma migração gradual é necessária. Também não vamos ser ingênuos de pensar que as redes mais abertas continuarão abertas no longo prazo. Fique atento.

Downteching

As big techs nos adestram para pensarmos que só nelas existe vida. Mas não é bem assim. As big techs estão avançando o sinal e é preciso buscar oxigênio fora delas mesmo com perda de comodidade e maior esforço.

Uma das maneiras de reduzir sua dependência das big techs é fazendo downteching, ou seja, buscando soluções tecnológicas anteriores e simples, mas ainda eficientes. Alguns exemplos indicados para quem gera conteúdo e quer se comunicar com os outros sem as big techs embaçando a relação.

  • Priorize seu próprio site. Quem produz conteúdo precisa de URL própria. A sua URL é sua casa. Ali vigoram suas regras e você não será despejado pelo Faceberg.
  • Divulgue por newsletter. As novidades por e-mails ainda são uma alternativa sólida para se comunicar com o seu público.
  • Listas de discussão. Você pode formar grupos de discussão por e-mail. São as velhas listas de discussão.
  • Contato físico. Construa sua agenda de contatos com e-mails, números de telefone, endereços físicos, etc.

Resistência cibernética

Algumas táticas de resistência podem ser adotadas em casos extremos. Com os exemplos abaixo você ficaria imune caso seu aplicativo favorito seja banido pelas big techs.

  • Desvie das stores. Aprenda a baixar apps fora das grandes lojas. É possível e nem é difícil.
  • Acesso web. Acesse conteúdos no navegador do smartphone em vez de usar apps. Aí você não passa pela Apple ou Google que acham que sabem o que você pode fazer no celular.
  • Anônimo. Use navegação anônima sempre que possível. Dificulte a coleta de dados pelas big techs.

Passo a passo para sair da Matrix das redes sociais

Não é fácil abandonar um vício, não é mesmo? O primeiro passo é admitir que o vício existe. Você precisa tomar a pílula vermelha e encarar a realidade. Veja o vídeo e leia o texto.

Não é tudo de uma vez. Caso você queira seguir o caminho da autonomia e da qualidade de vida considere esse passo a passo. Lembre-se: não é uma tarefa para fazer em uma tarde chuvosa. Leva tempo. O passo a passo abaixo dura 8 semanas. Dê um passo a cada dia e não volte atrás.

  1. Diagnóstico. Faça uma lista das redes sociais que você utiliza e responda por escrito à pergunta: Por que utilizo esta rede social? Guarde para ler no futuro. Em seguida, coloque suas redes sociais em ordem de importância para você. Outra parte importante do diagnóstico é medir o seu tempo gasto com redes. Meça por 24 horas ao menos; melhor se medir por uma semana completa. Ainda no diagnóstico classifique os serviços que você usa em duas categorias: pílula azul e pílula vermelha. Entenda melhor nesta postagem.
  2. Primeiros cortes. Silencie imediatamente as notificações das redes que você definiu como pouco importantes. Saia de grupos que nada agregam, silencie os chatos e dementadores, faça uma limpa nas páginas e pessoas que você segue. Se você faz login social em sites com Google, Facebook ou Twitter mude isso. Use o login normal do site e corte essa dependência das big techs.
  3. Redução do tempo de uso. O tempo de uso medido na fase de diagnóstico será o seu teto. Inicie a gradual de redução de tempo nas redes. Esta etapa deve se estender por 5 semanas. A cada semana reduza um pouco. Anote suas conquistas em uma tabela ou agenda. No começo faça cortes mais drásticos e, no final, cortes menores até chegar ao ideal. Reduções semanais vão ajudar você a se adaptar sem ter convulsões.
  4. Horário para acessar. Defina horários para usar redes sociais. Esta etapa se estende por 4 semanas. A cada semana você vai ampliar os horários desconectados. Por exemplo: na primeira semana pare de acessar redes durante as refeições. Na segunda corte os acessos no horário de dormir.
  5. Períodos desconectados. Desconecte-se algumas horas por dia, um dia por semana, um final de semana por mês, uma semana por ano. Será ótimo se os seus momentos desconectados coincidirem com seu horário de trabalho, suas horas de estudo ou sono.
  6. Diversificação. Nesta etapa você vai incluir redes e serviços pílula vermelha na sua rotina. Por exemplo: para pesquisas mais sensíveis troque o Google por um buscador com maior privacidade. Em alguns casos é melhor abandoar o uso de serviços pílula azul trocando-os definitivamente por opções livres, privadas e seguras.
  7. Fase ativa. A meta dessa fase é sair da passividade. Hora de assumir o comando. Desative as notificações de todas as redes sociais. Em vez de apenas aceitar sugestões dos algoritmos, passe a pesquisar conteúdo ativamente. Escolha o que você vai ver e quando vai ver.
  8. Golpes finais. Remova os aplicativos de rede social do celular. Se necessário, acesse pelo navegador web. Encerre as contas nas redes sociais que deixaram de ser importantes para você. Converse com pessoas ao vivo, leia um bom livro, faça exercícios, aprecie a natureza.

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