Vamos começar nosso estudo analisando duas frases que contém advérbios.
É lícito dizer que compulsivamente indica o modo como Pedro bebe e que pontualmente particulariza a forma como João compareceu. Ou seja, as duas palavras estão modificando as ações denotadas nas frases. Diante disso, podemos dizer que em muitos usos, uma característica bem definida dos advérbios é funcionar como complementos frasais. Vamos adiante, analisando outra série:
Na primeira frase, linda modifica Gisele. Na segunda frase, muito modifica a ação denotada por desfilou. Na terceira frase, linda modifica Gisele, mas muito não modifica a ação do verbo, modifica sim, o adjetivo linda. Conclusão: advérbios podem modificar adjetivos. Vamos adiante.
Na primeira frase, entende-se que muito quantifica a ação indicada na frase e explicitada pelo verbo. Já na segunda frase, se nos baseássemos no comportamento típico dos adjetivos, por exemplo, concluiríamos que Pedro dirige muito e bem. Mas não é o que acontece com os advérbios.
A interpretação correta da frase é que Pedro dirige mais do que bem, dirige bem além da conta. O advérbio muito, nesse caso não modifica a ação do verbo, mas modifica o outro advérbio (bem). Esta é mais uma característica dos advérbios. Modificam outros advérbios.
Com essas análises, concluímos que advérbios podem complementar frases, além de modificar adjetivos e outros advérbios. Isso nos servirá como ponto de partida para nossa análise dos advérbios, uma classe difícil, cuja definição exige um esforço considerável. Para isso, teremos que levar em conta aspectos morfológicos, sintáticos e semânticos.
Estudando atentamente os adjetivos e os advérbios encontramos várias similaridades e convergências entre as duas classes, de tal forma que chega ser tentadora a ideia de tratá-las como subconjuntos de uma classe maior de modificadores. Essa conclusão surge da observação de séries como a apresentada a seguir:
Observe que tanto linda como lindamente apresentam o mesmo radical, que ambas as palavras são modificadores e o sentido que portam é basicamente o mesmo nos dois casos exemplificados, ou seja, uma qualidade, a beleza, está sendo atribuída a uma pessoa e a uma ação respectivamente.
Outra convergência que se observa é o fato de muitos adjetivos apresentarem advérbios correspondentes como:
Adjetivo | Advérbio |
Muito, muita, muitos, muitas | Muito, muitíssimo |
Rápido, rápida, rápidos, rápidas | Rápido, rapidamente |
Pouco, pouca, poucos, poucas | Pouco, pouquíssimo |
Bem | Bem |
Muitos advérbios derivam de adjetivos pelo acréscimo do sufixo –mente à forma feminina do adjetivo, se houver. Em outros casos, não temos diferença morfológica notável entre adjetivo e advérbio, exceto as flexões de gênero e número no adjetivo. Por exemplo:
As semelhanças entre adjetivos e advérbios são acentuadas no aspecto semântico. Já no aspecto morfossintático, observam-se diferenças como se vê na tabela a seguir:
Característica | Adjetivo | Advérbio |
Flexão em gênero | Sim | Não |
Flexão em número | Sim | Não |
Flexão em grau | Sim | Em alguns casos |
Classes que determina | Substantivos | Adjetivos Advérbios |
Complementa frases copulativas | Sim | Não |
Complementa frases não copulativas | Sim | Sim |
Os adjetivos e advérbios contrastam nas condições em que podem ser empregados para formar sintagmas complementares da frase. Vamos resumir as possibilidades.
O adjetivo pode ser empregado como complemento de frases copulativas e o advérbio não.
Tanto o adjetivo como o advérbio podem complementar frases não copulativas, mas nesse caso, o adjetivo modifica apenas o sujeito e o advérbio modifica a frase como um todo.
Note que na primeira frase, o adjetivo linda modifica modelo. Na segunda frase, lindamente modifica a modelo desfilou.
As características morfológicas de adjetivos e advérbios podem ser decisivas para a interpretação do significado da frase como vemos em seguida:
Na primeira frase, o fato de muito não concordar em número e gênero com manifestantes indica que muito está sendo usada como advérbio. Em função disso, o falante vai entender que muito determina radicais em vez de determinar manifestantes, já que na gramática do português advérbio não determina substantivo.
Na segunda frase, o fato de muitas concordar em gênero e número com manifestantes, induz o falante a considerar muitas como adjetivo. Como no português, adjetivo só determina substantivo, a determinação de muitas recai sobre manifestantes e a segunda frase ganha sentido diferente da primeira.
Em alguns casos, o adjetivo masculino singular se confunde com seu advérbio correspondente, gerando frases ambíguas como a seguir:
Afinal, quando agiu ele estava bem, ou a ação é que se deu corretamente? A ambiguidade deve-se ao fato de bem poder ser entendido como advérbio ou adjetivo.
Diante das convergências que constatamos entre adjetivos e advérbios, poderíamos propor um modelo de análise em que as duas classes seriam tratadas como casos de uma classe mais abrangente. Dessa forma, palavras como as agrupadas a seguir seriam tratadas como integrantes de um mesmo lexema.
As flexões com gênero e número definidos seriam tratadas como pertencentes ao caso adjetivo e a flexão terminada em mente, seria incluída no caso adverbial. Observe que estaríamos unindo os adjetivos e advérbios em uma mesma classe, flexionada em caso. Respaldo para tal modelo há, afinal, o adjetivo e o advérbio, se distinguem basicamente pelas funções sintáticas distintas que desempenham.
Esse exercício de análise foi desenvolvido apenas para mostrar as afinidades que unem os adjetivos e os advérbios. Não vamos criar a super classe dos adjetivos mais advérbios, embora a ideia seja tentadora.
Uma característica marcante dos advérbios é o fato de funcionarem como modificadores de adjetivos e de outros advérbios. Se considerarmos que o adjetivo modifica o substantivo e este não modifica outros itens, temos uma cadeia de modificação como no exemplo:
No exemplo, o substantivo tese é o determinado primário.
O advérbio não pode desempenhar a função de modificador primário.
Outra característica importante dos advérbios é a possibilidade de formarem isoladamente um sintagma que complementa alguns modelos de frase que seguem a estrutura sujeito + sintagma verbal + complemento. Veja alguns casos:
A ação do advérbio, nesses casos se estende sobre o conjunto sujeito + sintagma verbal. É o que se conclui fazendo perguntas que esclarecem a função do advérbio na frase. O que se deu rapidamente? A subida do preço. O que se deu subitamente? A chegada da tempestade.
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Gostei Muito! Esse post sem dúvida vai me ajudar muita na prova que eu irei fazer, Muito Obrigado!
não entendi
Ainda dá pra complementar mais, dizer que o advérbio é um modificador de adjetivo, de outros advérbios, de verbo, e substantivo (raramente).
Exemplos:
Elas acordam cedo.
A palavra cedo modifica o verbo, elas não acordam à noite, ou logo, ou à tarde, ou de manhã, ou qualquer outro modificador. Ou seja, especifica que elas acordam em uma dimensão temporal.
E se eu disser:
Maria é verdadeiramente mulher.
Ou seja, o advérbio modifica o substantivo mulher, com a ideia de certeza, que a informação é convicta que Maria é mulher sem dúvidas nenhuma.
Mulher é um substantivo adjetivado, ou seja, é um adjetivo.Então sua definição não está correta.