Em nossa língua, há palavras formadas por um só morfema como de, a, e, com, eu, me, mas,bem, mal, etc. Desses morfemas, que são livres, trataremos no estudo das classes de palavra, pois nesse caso, morfema e palavra se confundem. Outras palavras, são formadas por mais de um morfema como des-en-cant-ado, geo-graf-ia, de-form-ado, etc. São palavras que contêm morfemas presos, os quais estudaremos a seguir.
Para trabalharmos em uma linha de raciocínio consistente vamos inicialmente considerar somente palavras que seguem o modelo regular de formação a que chamaremos PRS (prefixação-radical-sufixação). Esse modelo não é válido para todas as palavras de nossa língua, mas a partir dele, podemos estender a análise até abarcar as demais ocorrências. Vamos agora, analisar os componentes do modelo.
Observe a série a seguir:
Canto, cantos, cântico, cânticos, cantilena, cantilenas,cantoria, cantorias, cantiga, cantigas, cantata, cantatas,cantável, cantáveis, cantor, cantora, cantores, cantoras,cantar, cantando, cantado, cantas, cantamos.
O traço comum às palavras da série é o morfemacant, chamado radical, o qual porta a base de significação das palavras dadas. É uma base rarefeita, vaga, que vai sendo delimitada com maior precisão pelo acréscimo de outros morfemas à palavra.
O radical porta o núcleo de significação da palavra, que é determinado pelos prefixos e sufixos integrantes da palavra.
Na série a seguir, alguns prefixos estão em negrito.
Os pares de palavras da série diferem entre si pelo morfema inicial (in, re e des) na segunda palavra do par. Analisando os pares da série vemos que a função dos morfemas in, re e des é alterar a base de significação do radical. In, re edes são prefixos típicos da língua portuguesa e apresentam características como:
Sufixos são morfemas colocados após o radical nas palavras que seguem o modelo PRS. Vamos dividi-los em dois grupos: derivativos e flexivos.
Observe a série dada:
Os morfemas em negrito cumprem duas funções: modificam a base semântica do radical e determinam a classe morfológica típica da palavra. O morfema ilena, por exemplo, dá à palavra uma característica substantiva. Isso quer dizer que a palavra passa a ter um espectro de significação típico de substantivo, o que habilita seu uso em contextos morfossintáticos específicos.
Os sufixos ilena e oria, são morfemas que definem perfil de substantivo para a palavra, mas geram palavras pertencentes a lexemas diferentes. Os traços de significação dos dois morfemas são distintos mas ambos dão às palavras que compõem características morfológicas substantivas.
Há, basicamente, quatro tipos de sufixos derivativos. Veja alguns exemplos.
Muitos verbos são formados simplesmente pela inserção do sufixo flexivo verbal após o radical. Exemplos: cant-ar, vend-er, part-ir. Em outros casos, estão presentes sufixos derivativos verbais como por exemplo: amen-iz-ar, bord-ej-ar, afug-ent-ar. Note que o sufixo derivativo verbal modifica a base de significação do radical.Bordejar é diferente de bordar.
Os sufixos flexivos agregam traços de significação à palavra, mas de forma bastante especializada. Os sufixos flexivos estão ligados às categorias morfológicas número, gênero, grau, pessoa, tempo, finitude, modo e aspecto. Podemos subdividir os sufixos flexivos em dois grupos: verbais e nominais.
Observe as séries que se seguem:
Os morfemas em negrito são flexivos, pois portam informação de número, gênero, grau, etc. Algumas características importantes dos sufixos flexivos:
Na palavra inconformadas temos uma formação analítica, ou seja, cada morfema exerce uma só função.
Na palavra cantamos temos formação sintética, pois o morfema amos porta vários traços sinteticamente como indicar que se trata de verbo, primeira pessoa, plural, presente e modo indicativo. Os sufixos verbais, pelo caráter sintético, são ao mesmo tempo derivativos e flexivos.
A Gramática Tradicional considera que a palavra pode apresentar mais de um radical como emmito–log-ia, geo–graf-ia e demo–crac-ia. Muitas palavras do português, originárias do latim e do grego, em especial as usadas nas ciências, apresentam esse tipo de formação.
Analogamente, teríamos: Psicologia, Sociologia, Termologia, Demografia, teocracia, aristocracia e plutocracia. Analisando com mais cuidado os morfemas considerados como primeiro radical da palavra, vemos que eles apresentam característica de prefixos, ou seja, são determinantes do radical que vem em seguida.
É o que ocorre com os exemplos dados.
Em nossa análise, vamos considerar que o primeiro radical da Gramática Tradicional é um tipo específico de prefixo e que as palavras de nossa língua apresentam apenas um radical. É bom lembrar, porém, que morfemas como mito, geo e demo têm natureza distinta de outros como in, re ou des. Aqueles são nocionais e estes têm um perfil mais próximo das preposições de nossa língua. Talvez em função disso, tenham sido tratados distintamente na Gramática Tradicional.
Podemos sintetizar a formação regular de palavras que seguem o modelo PRS na tabela a seguir, que inclui notação em estilo matemático.
Constituinte | Sequência | Lê-se |
Palavra | Pal = (Pre) Rad Suf | Compõem a palavra: prefixação (opcional), radical e sufixação. |
Prefixação | Pre = ([Pref]n) Pref | Compõem a prefixação: prefixo mais um número indefinido opcional de prefixos extras. |
Radical | Rad | O radical é indecomponível. |
Sufixação | 1 Suf = Sufs | A sufixação pode ser composta por sufixação substantiva. |
2 Suf = Sufadj | A sufixação pode ser composta por sufixação adjetiva. | |
3 Suf = Sufv | A sufixação pode ser composta por sufixação verbal. | |
4 Suf = Sufadv | A sufixação pode ser composta por sufixação adverbial. | |
Sufixação substantiva | Sufs= (Sdsub) Sfgr Sfgn Sfn | A sufixação substantiva é composta por sufixo derivativo substantivo (opcional), sufixo de grau, sufixo de gênero e sufixo de número. |
Sufixo derivativo substantivo | Sdsub | Indecomponível. |
Sufixação adjetiva | Sufadj= Sdadj Sfgr Sfgn Sfn | A sufixação adjetiva é composta por sufixo derivativo adjetivo, sufixo de grau, sufixo de gênero e sufixo de número. |
Sufixo derivativo adjetivo | Sdadj | Indecomponível. |
Sufixo verbal | Sufv = (Sdver) Sfver | O sufixo verbal é formado por sufixo derivativo verbal (opcional) e sufixo flexivo verbal |
Sufixo derivativo verbal | Sdver | Indecomponível |
Sufixo flexivo verbal | Sfver | Indecomponível |
Sufixo flexivo de grau | Sfgr | Indecomponível |
Sufixo flexivo de gênero | Sfgn | Indecomponível |
Sufixo flexivo de número | Sfn | Indecomponível |
Sufixação adverbial | Sufadv= Sufadj.fem.singmente | A sufixação adverbial é composta por sufixo adjetivo no feminino singular mais o sufixomente. |
Também podemos representar a estrutura morfológica das palavras em equações, progressivamente decompostas.
Pal = (Pre) | Rad | Suf |
Pal = (([Pref]n) Pref) | R | Sufs |
Sufadj | ||
Sufv | ||
Sufadv |
P = ([Pref]n) Pref | R | (Sdsub) Sfgr Sfgn Sfn |
Sdadj Sfgr Sfgn Sfn | ||
(Sdver) Sfver | ||
Sufadj.fem.sing mente
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