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Crítica | Gran Torino

O veterano volta às armas

Gran Torino
Direção de Clint Eastwood
2008 : EUA :  116 min
Com Clint Eastwood (Walt Kowalski),
Bee Vang (Thao),
Ahney Her (Sue Lor) e
Cristopher Carley (Padre Janovich)

Rabugento, é apelido. O nome é Sr. Kowalski, um polaco-descendente do meio oeste americano que diz o que pensa e, geralmente, pensa o que não devia dizer. O Sr. Kowalski, não o chamem de Walt, perdeu a esposa recentemente, não se dá com os filhos, noras e netos e só conversa amigavelmente com sua cadela labradora. Kowalski, entretanto, tem um Ford Gran Torino 1972 que ele mantém impecavelmente polido como se fosse extensão e metáfora de si mesmo.

Um muscle car como metáfora

Assim como o Sr. Kowalski, o Gran Torino é remanescente de uma época de ouro que se perdeu no passado. Kowalski combateu na Guerra de Coreia, mas seus netos nem sabem onde fica a Coreia. Ele trabalhou em uma montadora americana de automóveis onde instalou a coluna de direção de seu próprio Gran Torino, mas seu filho é vendedor de uma concessionária japonesa. O sr. Kowalski é o último branquelo aguado que restou no bairro decadente de Detroit em que mora, agora infestado por gangues de chicanos, negros e chinas. Para lembrar a todos que ali ainda mora um americano, ele mantem a bandeira dos EUA hasteada na varanda.

Dívidas com o passado

O final da estrada tem sido barra para o sr. Kowalski, mas ele é um durão à moda antiga. Bronco e desbocado, não demora a entrar em atrito com a família de vietnamitas que se mudou para a casa ao lado da sua. Um desses orientais é o jovem Thao, um cara, à primeira vista, totalmente incompatível com seu vizinho linha dura. Kowalski o considera um torto sem futuro, porém, aos poucos percebe algumas virtudes nesse tímido rapaz, que luta como pode para não ser levado para a marginalidade pelos primos.

O sr. Kowalski e Thao são sobreviventes em um mundo degenerado e isso é o que os aproxima. O americano típico, ultrapassado e xenófobo se encontra com o típico imigrante sem preparo para a discriminação da sociedade americana. O relacionamento entre os dois é conturbado e tudo começa quando Thao tenta roubar o Gran Torino de Kowalski em uma iniciação ao crime imposta pela gangue dos primos de Thao. Por caminhos sinuosos, os dois vão desenvolvendo uma relação de mestre e aprendiz e, por que não dizer, de pai e filho. Kowalski insere Thao no mundo americano e os vietnamitas ensinam o branquelo a enxergar além do umbigo.

Sempre é tempo de aprender e a irmã de Thao dá algumas lições de história e de cultura oriental ao velho. Como se não bastasse, Kowalski também precisa se reconciliar com a sua fé. Quem assume essa árdua tarefa é o jovem padre Janovich que terá de honrar a batina se quiser acordar o velho do seu sono de crença. O velho não respeita padres virgens de 27 anos que não sabem nada sobre a vida e a morte. Infelizmente, o mundo decadente que Kowalski odeia está repleto de violência e a história dele com os vietnamitas vai desandar para a tragédia. Só então, veremos o que o velho entende sobre vida e morte.

O veterano com lenha para queimar

Clint EastWood é um especialista em filmes sobre veteranos que são chamados de volta à ação, uma vez mais antes do pôr do sol. Para quem pensa que esse tipo de personagem não existe no mundo real, que se trata apenas de compensação psicológica para os que têm medo de envelhecer, basta lembrar do exemplo do próprio Clint. Quanto mais o tempo passa, mais ele nos surpreende com os filmes que cria. Kowalski é um desses durões vintage do imaginário do velho Clint. Kowalski tem muitos defeitos e pesados remorsos de seu passado na guerra. Talvez, ele espere demais das pessoas, talvez queira que todos sejam sólidos como ele, talvez o mundo já não seja um lugar apropriado para caras como ele. Micos amestrados pelo Hugo Chávez diriam que o final trágico do filme é uma tentativa de redenção do Império, que Kowalski é um americano médio tacanho boca suja racista superado que pensa que a capital do Brasil fica em Buenos Aires e que tudo se resolve com uma pistola 9 mm. Tudo bem, ele é exatamente assim, mas … assista o filme.

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