Arquivo da tag: década 1940

Crítica | Como era verde meu vale

Paraíso perdido

How green was my valley
Direção de John Ford
1941 : EUA : 118 min : branco e preto
Com Walter Pidgeon (Mr. Gruffydd),
Maureen O’hara (Angharad),
Roddy McDowall (Huw Morgan),
Donald Crisp  (Gwilym Morgan) e
Anna Lee (Bronwyn Morgan)

O filme começa com Huw Morgan, narrador e personagem, se preparando para deixar o vale em que viveu toda sua vida até então. O lugar está decadente e triste: vemos uma colina com casas decrépitas enfileiradas à beira da estrada e, lá no alto, chaminés de uma mina de carvão expelindo uma inesgotável e grossa fumaça negra. Depois dessa breve introdução, a narrativa recua 50 anos e voltamos à infância do narrador, a um paraíso mítico que se perdeu no tempo.

O vale era verde

O mundo perfeito de Huw (Roddy McDowall) é simples e puro. Nele, cada pessoa tem um lugar e um papel a cumprir. Na pequena comunidade do País de Gales vive-se em função da mina de carvão onde todos os homens trabalham. As mulheres cuidam da casa, a família é completa, numerosa e sólida. A mesa é farta e todos sentam juntos na hora do jantar, fazem uma oração e só então o patriarca distribui a comida. No domingo, a família unida vai ao culto protestante na pequena capela. Todos conhecem a todos, namoro é uma coisa muito séria e termina em casamento. E as festas de casamento são alegres, com muita dança, cantoria e regadas a cerveja. Tudo perfeito não fossem as coisas da vida.

Esse é um filme sobre perda e degradação. O paraíso existiu em algum momento no passado. A família estava toda reunida à mesa, não havia conflito e tudo funcionava como um bom relógio. No entanto, escória negra que sai da mina de carvão começa lentamente a invadir o verde vale. Os mineiros que recebiam o suficiente para uma vida digna, de repente, vêem seu salário rebaixado por conta da lei da oferta e da procura. Mas esse é só o primeiro sinal do que virá.

Dois mundos

Há dois vales verdes no filme: um que é perfeito e que existe na memória de Huw e o outro que é real. No vale verde real crianças trabalham no fundo da mina, onde a qualquer momento podem ocorrem acidentes sérios; o serviço é insalubre e não há garantias trabalhistas. A comunidade é fechada e mesquinha; os costumes são rígidos e os homens são briguentos, beberrões e broncos. Os pais de Huw são conservadores demais e os seus irmãos desafiam a autoridade do pai apesar da austeridade que impera na casa dos Morgan.

Ninguém melhor que o mestre John Ford para nos mostrar a coexistência desses dois mundos antagônicos. Ford era um visionário. Seus filmes adiantam em décadas muitas questões fundamentais. Em Como era verde meu vale, Ford colocou a questão da degradação do ambiente muito antes do primeiro ecologista. Sua visão da questão social no filme tem uma maturidade que deve irritar os esquerdistas esquemáticos.

Fico pensando se a mensagem do filme é pessimista ou se a idéia de Ford era propor um resgate do paraíso perdido. É possível escapar da degradação do mundo tecnológico? O mundo só é perfeito na infância e depois dela estamos condenados à decadência? O vale verde é possível ou é apenas uma miragem de vida simples e comunitária engolida pelo mundo industrializado? Cada um interprete como achar melhor, mas o vale era verde.

Marcante

  • As cenas que mostram o vale verde no seu auge: o retorno do trabalho, a família numerosa reunida à mesa, as cantorias, o culto dominical, o casamento. Com certeza, o Céu é exatamente assim.

Filmes

Crítica | O tesouro de Sierra Madre

Parábola universal da cobiça

The treasure of Sierra Madre
Direção de John Huston
1948 : EUA :  126 min : branco e preto
Com Humphrey Bogart (Fred Dobbs),
Tim Holt (Bob Curtin),
Walter Huston (Howard) e
Bruce Benett (Cody)

Garimpeiros são personagens marcantes da aventura humana. Dispostos às mais duras provações em nome da sorte grande, eles sempre estiveram na vanguarda da colonização. Predadores da natureza virgem, estabelecem o contato inicial com as culturas locais e como uma onda avançam pelas terras inexploradas, deixando um rastro de violência e depredação.

Assim foi, assim é. Não se pode dizer que são o tipo ideal de herói para filmes hollywoodianos. O diretor John Huston sabia disso, mas decidiu fazer um mergulho no lado sombrio da natureza humana contando a história de quatro garimpeiros e seu mundo.

Continue lendo Crítica | O tesouro de Sierra Madre